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Bananal, 16 de outubro de 1998
Bananal, 09 de Descartes de 209
À
Associação dos Juizes Federais - AJUPE
da 2a Região - Rua México, 45 -11º andar
Centro - Rio de Janeiro - RJ
CEP : 20031 - 144
ajufesocial@ax.apc.org
Coordenação do XV Encontro
Nacional dos Juizes Federais.
Att: Meritíssimos Srs. Juizes de Direito Federal.
Dr. Ricardo Nogueira - Coord. Geral do Evento.
Dra. Simone Schreiber - Co-Organizadora
Dr. Alfredo França Netto - Co-Organizador.
Dra. Salete Maccalóz - Co-Organizadora.
Att: Senhora Paula Rita Mesquita de Carvalho
Coordenadora Executiva do Evento
Assunto:1) O Direito e os Deveres, segundo o Positivismo.
(direito.zip)
2) Artigo sobre O Dia da Pátria e a Reforma
Agrária, segundo o Positivismo. (patriag1.zip)
Prezados Senhores,
Ao tomar conhecimento da ocorrência de um Conclave Nacional, isto é, o XV Encontro Nacional dos Juizes Federais, que se realizou no Rio de Janeiro, na ‘heis" Cidade Maravilhosa, entre os dias 07 e 11 de outubro de 1998, (28 de Shakespeare a 4 de Descartes de 209) onde estiveram reunidos os mais renomados e eminentes Magistrados Federais de minha Pátria, resolvi por bem, mesmo atrasado, me entusiasmar, criando coragem e bastante prudência, para escrever algumas linhas, de elevado conteúdo filosófico e religioso, com objetivo de fazer chegar aos Senhores Meritíssimos Juizes de Direito, que o Mestre dos Mestres, que completa 200 anos de nascido, neste ano, o Filósofo Augusto Comte, que deixou dentre a sua vasta Obra Filosófica, os quatro volumes da Política Positiva ou Tratado de Sociologia Positiva, onde podemos encontrar as razões lógicas, a respeito de uma das Artes do Bom, ( Sã Política, Educação dos Sentimentos, Medicina, Deveres/Direitos), os Deveres / Direitos; que baseados em raciocínios científicos, substanciados, nas Ciências Sociologia Positiva e Moral Positiva,( sendo estas duas ciências, regidas por Leis Naturais , como a Matemática, a Astronomia, a Física a Química e a Biologia) alavancados pelos impulsos gerados pelo comando dos Sentimentos, egoístas - Altruístas, respectivamente; promovem os Sacerdotes do Direito e os Sacerdotes dos Deveres.
Os Sacerdotes do Direito, são os Juizes de Hoje, e os Sacerdotes dos Deveres serão os Sacerdotes Positivistas, quando do Estado Normal, isto é, quando a Religião da Humanidade estiver plenamente consolidada. Quem não sonha, não realiza. Pode ainda hoje ser Utópica, mas jamais quimérica.
Nos quatro volumes da Política Positiva, encontramos assuntos sobre Direito e Deveres, nas seguintes paginas:
Volume I - Pagina, 153 /154 - Discurso Preliminar sobre o Conjunto do Positivismo - na sua parte final - Conclusão - Religião da Humanidade.
Volume II - Pagina, 103 - Doutrina do Direito.
Volume III - Pagina, 601 - Doutrina do Direito.
Volume IV - Pagina, 467 - Escola de Direito.
É bom deixar registrado, que como constam em alguns livros de Sociologia Jurídica, que Augusto Comte foi alérgico ao Direito, o que não é verdade, pois os Positivistas, tem uma forma de raciocinar, influenciado pelos Sentimentos Altruístas, subordinando ao máximo a personalidade à sociabilidade; que é o inverso do que ocorre hoje em dia. Se educarmos os sentimentos dos Seres Humanos, a serem mais Altruístas do que egoístas, procurando simultaneamente eliminar o Capitalismo pelo Trabalhismo, a caótica democracia e a retrógrada aristocracia, pela Sociocracia, onde o Capital Material Industrial, tem a sua origem no Social, e sua aplicação no Social; aí sim, inicia-se a harmonia humana, onde somente o mérito (capacidade, competência e situação) ,seja o fator de promoção; entre as Classes Patronal e Proletária, e dentro de cada uma delas.
Esta evolução humana, para o Estado Normal, de nossa espécie, da Homo- sapiens para Homo-altruisticus; e não a de hoje, que predomina o Homo-economicus, que se assim permanecer, nos levará para a retrograda espécie, Animalis-homo.
Por isso, devemos lembrar que o Positivismo, consubstancia, em cada fase histórica, o conjunto dos esforços da coletividade, para bem interpretar as realidades, tendo em vista melhor adaptar, o Mundo e o Homem, aos interesses supremos da Humanidade ( Humanidade, é o conjunto dos Seres Convergentes, do passado do futuro e do presente, que concorreram, concorrerão e concorrem, para a melhoria do Bem Estar do Ser Humano na Terra, e agora, no Cosmos) ( Seres, são todas as sensações que o cérebro percebe através dos 8 sentidos) .
Esta é a razão do Positivismo não ser uma obra revelada de um fato, por um determinado indivíduo; nem o resultado de devaneios filosóficos, mais ou menos fantasiosos, de um cérebro excepcional, em busca de soluções quiméricas, para os problemas humanos, à moda de Platão , Morus, Capanela e tantos outros pensadores, sem dúvida dignos de nossos respeitos, não obstante a inocuidade prática de seus esforços, muito mais poéticos que científicos.
Somente com o estudo das Obras de Augusto Comte, no seu original, com um orientador, para esclarecer os termos lá existentes, será possível, pessoas de elevado padrão intelectual, cultural e altruístico, se familiarizarem com a grandeza desta proposição Utópica mas jamais quimérica.
Somente pela Ciência, pela influencia do Altruísmo, por meio da organização Industrial, haverá união harmônica, ou melhor, pacífica dos Homens.
Assim, Augusto Comte lembra que, quando surgir o "Novo Sacerdote", que venha ter a sua principal missão, verdadeiramente assistida pela Mulher (não as feministas) e pelos proletários (os mais educados), na substituição dos atuais Juizes de Direito, que queiram ou não, defendem muito mais a Classe Burguesa, da atual Sociedade; esta, que com o passar dos tempos, terá a sua existência extinta, pelas razões cientificamente expostas por Augusto Comte, quando desta nossa evolução sociológica.
Quando atingirmos o Estado de regeneração, onde surgirá uma forma de subordinarmos todos os nossos Direitos, aos nossos Deveres; devido a mudança no habito de comportamento realizado pela Educação dos Sentimentos;onde a Política será a Sã Política, se tornando não mais empírica, e sim sistemática, devido a sua subordinação à Ciência Moral Positiva, e com base na Ciência Sociologia Positiva.
Da mesma forma, como já ocorreu com a Medicina, que já foi empírica, e hoje em dia é Sistemática, com base na Ciência Biologia, podendo estar subordinada à Moral Positiva ou a Imoralidade, vai depender da Educação que o médico tenha recebido de seus pais.
É bom lembrar, e por bem alertar, que jamais a Medicina, a Política, a Educação(não é, instrução) e o Dever (Direito) serão Ciências, sempre serão Artes do Bem (Bom), a não ser que clonemos todos os seres humanos, de uma única origem celular.
O Positivismo esclarece cientificamente, que para podermos nos tornar mais sociáveis, devemos subordinar a Personalidade à Sociabilidade; o egoísmo ao Altruísmo, a Análise à Síntese, o Progresso à Ordem, e os Direitos aos Deveres; e Augusto Comte, em suas máximas, a este respeito, nos diz:
"Ninguém possui outro Direito, se não, de fazer sempre, o seu Dever".
"
Temos que substituir os Direitos Divinos e os Direitos Humanos, por Deveres Universais"
"A discussão dos Direitos, nós substituiremos pela fácil Determinação dos Deveres"
Finalmente, para não me estender por demasiado, e ao mesmo tempo me manter simpático, anexo a este artigo, a tradução, do texto do primeiro volume, da Política Positiva, em que Augusto Comte aborda, entre muitas coisas, o Direito e o Dever : CONCLUSÃO GERAL DO DISCURSO PRELIMINAR - Religião da Humanidade.
Na espectativa de ter levado aos Meritíssimos Senhores Juizes de Direito, das Varas Federais, de minha Pátria, a lembrança dos seus Professores de Filosofia do Direito ou de Sociologia do Direito, nos bancos universitários, me despeço, e permaneço às ordens ,
Atenciosamente,
Saúde, Respeito e Fraternidade.
Paulo Augusto Lacaz / Positivista
P.S. 1) Segue no "Attach", o meu Curriculum Vitae, e alguns artigos de assunto atuais, pelo enfoque positivista, para as Vossas apreciações, e sugiro a seguinte seqüência de leitura : (1) cvitae.zip; (2) aprecia.zip; (3) doaorgao.zip; (4) biobomb3.zip; (5) patousa.zip; (6) ditaper1.zip; (7) cassino4.zip ;(8) dsbrsil2.zip; (9) jogatina.zip; (10) peqemp.zip; (11) lavoisi2.zip; (12) comunism.zip; (13) maxcomt3.zip; (14) sindical.zip; (15) fazenda.zip; (16) fazenda1.zip; (17) monopexp.zip; (18) comdmso2.zip
2) Minha Home-page é http://www.doutrinapositivsta.hpg.com.br
ANEXO
CONCLUSÃO GERAL DO DISCURSO PRELIMINAR
RELIGIÃO DA HUMANIDADE ( Augusto Comte )
O amor por princípio, a ordem por base e o progresso por fim. Este é o caráter fundamental do regime definitivo para a sistematização de nossa existência; por uma combinação inalterável entre o sentimento, a razão e a atividade. A supremacia necessária da vida afetiva aí se acha melhor constituída do que outrora, segundo a preponderância do sentimento social.
Jamais opressivo em relação ao espírito, semelhante domínio do coração devota a inteligência ao serviço contínuo da sociabilidade, da qual ela deve consolidar o ascendente e esclarecer o exercício. A razão adquire uma autoridade que ela não pudera ainda obter, como única apta a desvendar a ordem fundamental que dirige toda a nossa existência. Nobremente aplicado à sua missão fundamental, que o preserva de toda divagação ociosa, o gênio científico encontra o alimento mais vasto na apreciação de todas as leis reais que influem sobre o nosso destino e, principalmente, no estudo de nossa própria natureza, individual ou coletiva.
O regime final desenvolve o surto permanente da imaginação, aplicada à sua destinação característica: a idealização contínua da realidade, As funções científicas são apenas indispensáveis para construírem a base exterior de todas as nossas concepções, mas as funções estéticas, convém melhor a nossa inteligência, contanto que o seu exercício, respeite sempre este fundamento necessário, alias muito próprio de prevenir seus desvios. Tais digressões, constituem ordinariamente, na nova existência, o exercício mais agradável e salutar de nossa inteligência, assim diretamente tendo a cultivar a afeição e prosseguir o aperfeiçoamento.
Longe de suscitar qualquer languidez (enfraquecimento), o amor universal nos impelirá sempre para a mais completa atividade, devotando nossa existência inteiramente ao aperfeiçoamento universal. Ele só nos obriga a estudar a ordem natural a fim de melhor aplicarmos nossas forças no seu aperfeiçoamento artificial. Até aqui apenas esboçado, seu surto só se poderia tornar degradante, se permanecesse limitado aos graus inferiores do aperfeiçoamento.
Desde que nossa sabedoria especulativa abrange diretamente seu principal domínio, nossa sabedoria ativa se aplica principalmente aos mais eminentes fenômenos, onde a ordem natural é ao mesmo tempo mais imperfeita e melhor modificável. Assim engrandecida e sistematizada, nossa existência prática prossegue de preferência o aperfeiçoamento intelectual e ainda mais o aperfeiçoamento moral.
Ao invés de dispor para a sequidão moral, a atividade nos impelirá incessantemente para melhor sentirmos que o amor universal constitui não somente nossa principal felicidade como também nosso mais poderoso recurso, indispensável à eficácia de todos os outros.
É assim que, na existência verdadeiramente positiva, o coração, o espírito e o caráter se consolidam e se desenvolvem mutuamente. A vida pública e a vida privada, devotadas a fazerem prevalecer sempre, tanto quanto possível, a sociabilidade sobre a personalidade, cada um de nós, nesse sentido e sob todos os aspectos, aplicará sem cessar suas forças afetivas, especulativas e ativas.
A Arte Social estabelece como princípio fundamental a separação normal entre os dois Poderes elementares, um moral, que aconselha, e o outro político, que manda. A preponderância deste, fundada sempre sobre a força material, representa o ascendente espontâneo da personalidade em nossa natureza, onde as mais grosseiras necessidades são as mais urgentes e mais contínuas.
O Poder Moral repousa sobre a convicção e a persuasão, sem se tornar jamais diretor. Emanado do sentimento e da razão, ele representa especialmente a sociabilidade, a única que ele cultiva imediatamente. Inferior em potência, embora superior em dignidade, opõe sempre a virtual classificação dos indivíduos, conforme o mérito mental e moral, à classificação real, segundo a riqueza ou a grandeza. Assim ele modifica a ordem natural de toda sociedade, invocando então o espírito de conjunto e o sentimento do dever, que a atividade prática tende a alterar.
Esse Poder moderador nos prepara para a vida real por uma sã educação-geral, principalmente relativa à Moral, mesmo em sua parte intelectual. Seu primeiro dever consiste em combater nossos vãos instintos de elevação temporal, que só se tornam salutares nas naturezas verdadeiramente destinadas a um mando indispensável. Essa solene renúncia à riqueza e à grandeza torna-se a base primitiva do verdadeiro poder teórico.
As mulheres se tornam auxiliares domésticos do Poder espiritual, sendo-lhes confiada toda educação privada, de que a pública só constitui um indispensável complemento sistemático. Como esposas, mais ainda participam de suas funções consultivas, atenuando pela persuasão o ascendente material que o Poder espiritual modera somente pela convicção. No gênero de vida pública que convém à sua natureza, elas o assistem espontaneamente, para elaborarem a opinião comum de que ele se torna o órgão sistemático, apreciando os atos e sobretudo as pessoas, de acordo com os princípios que ele lhes forneceu. Este íntimo concurso se desenvolverá melhor quando as mulheres, dignamente preservadas pelos homens de toda solicitude material, forem por toda parte tão estranhas à riqueza quanto à dominação, como se vê tantas vezes entre os proletários.
Embora menos pura e menos direta, a afinidade do povo em relação ao Poder filosófico naturalmente proporciona a este uma enérgica assistência civil em seu inevitável antagonismo com o Poder político. Segundo a disposição de espírito e ausência de preocupação pessoal, que predispõe os proletários, melhor do que seus chefes temporais, para a vista de conjunto e os sentimentos altruístas, eles fornecerão a principal base da verdadeira opinião pública, quando uma educação geral lhes permitir caracterizar bem as suas aspirações.
As necessidades dos proletários, e bem assim, suas tendências, os aproximarão do sacerdócio filosófico, que se tornará seu órgão sistemático em relação às classes dirigentes.
Correspondendo a essa natural atribuição, os proletários prestarão aos filósofos uma imponente assistência para a sua grande missão social de subordinar incessantemente o mando à moralidade. Nos casos excepcionais, que exigirem a intervenção política do Poder moderador, o caráter ativo de seu elemento popular dispensará seu elemento filosófico de uma anomalia que o iria desnaturar.
Apesar dessa vasta organização da força moral, o ascendente espontâneo de nossa personalidade se acha de tal modo pronunciado, que a solução efetiva do grande problema humano permanecerá sempre muito inferior a nossos legítimos anelos. Essa apreciação, comum a todos os aspectos de nosso verdadeiro destino, somente nos deve encorajar mais para melhor concertarmos todos os nossos esforços, no sentido de melhorar a ordem natural em suas disposições mais importantes, que são ao mesmo tempo as mais modificáveis e as mais imperfeitas.
Nosso principal progresso, tanto coletivo como individual, consiste em desenvolver sempre esse império, que só a nós pertence, sobre nossas próprias imperfeições, sobretudo morais. A Antigüidade somente preparou-lhe a manifestação por um indispensável preâmbulo, intelectual e social, posto que nossos generosos e cavalheirescos antepassados formularam o grande problema da ascendência da Moral sobre a Política.
Todas as fases essenciais dessa preparação coletiva lhe exigem equivalentes na iniciação individual, espontânea ou sistemática, sob pena de insuficiência.
É necessário em seguida que esses diversos modos e graus da regeneração humana, além de sua intima conexão, venham todos convergir naturalmente para um mesmo centro, próprio para constituir diretamente a unidade fundamental do regime definitivo. Sem essa condensação final, a sistematização positiva não poderia preencher integralmente a finalidade da antiga, apesar da homogeneidade e solidariedade superiores de seus elementos mais reais e mais estáveis.
A seu principio afetivo, sua base racional e seu fim ativo, o Positivismo deve acrescentar então um centro único que abrange ao mesmo tempo o sentimento, a razão e a atividade. Esta é a última condição de um ascendente decisivo, não só privado como público.
Semelhante condição se encontra inteiramente preenchida pela convergência natural de todos os aspectos positivistas, para a grande concepção da Humanidade a fim de constituir uma unidade definitiva mais completa e mais durável do que a unidade provisória do regime inicial. A extensão e aplicação da nova doutrina geral tornam-se acessíveis a todos os corações e, por conseguinte, a todos os espíritos, evitando hoje um longo e difícil preâmbulo científico, que só é indispensável a seus órgãos sistemáticos.
A essa preponderância direta do sentimento social corresponde o surto contínuo do espírito de conjunto, único que, deixando de considerar os conflitos parciais, permite conceber o concurso espontâneo de onde resulta esse imenso organismo. Assim como a afetividade, a razão participa dessa condensação final.
Todavia, a atividade não é menos inerente do que o sentimento e a razão à natureza da unidade positivista, porquanto o organismo mais composto deve reagir sem cessar sobre o meio correspondente, para modificá-lo subordinando-se a ele. Assim, a Humanidade condensa diretamente os três caracteres essenciais do Positivismo: seu motor subjetivo, seu dogma objetivo e seu fim ativo. A esse verdadeiro Grande-Ser (Família, Pátria e Humanidade), do qual somos cientemente os membros necessários, se referirão doravante todos os aspectos de nossa existência individual ou coletiva: nossas contemplações para conhecê-lo, nossas afeições para amá-lo e nossas ações para servi-lo.
Desse modo, pode-se conceber a vida como um verdadeiro culto contínuo da Humanidade, o qual exaltará e purificará todos os nossos sentimentos, alargará e esclarecerá todos os nossos pensamentos, enobrecerá e consolidará todos os nossos atos. O grande problema se acha diretamente resolvido tanto quanto possível, desde que, necessariamente, a subordinação da Política à Moral decorre de uma preponderância sagrada da sociabilidade sobre a personalidade.
Assim é que o Positivismo se torna finalmente uma verdadeira Religião, única completa e real, destinada a prevalecer sobre todas as sistematizações imperfeitas e provisórias, que emanaram do Teologismo inicial.
A unidade das antigas Teocracias foi insuficiente, por isso que sua natureza puramente subjetiva jamais pôde abranger plenamente a existência prática, sempre subordinada à realidade objetiva. Limitada ao sentimento e à razão, essa sistematização primitiva perdeu em breve uma notável parte de seu domínio intelectual, quando o espírito estético se libertou irrevogavelmente da tutela teocrática, para melhor adaptar-se à vida real, segundo sua vocação espontânea. Permanecendo ainda como únicos árbitros da Ciência e da Moral, os sacerdotes viram depois decrescer muito sua autoridade teórica, logo que o surto abstrato das concepções positivas dera origem à Filosofia propriamente dita. Embora ela só pudesse ser metafísica, tentou já uma sistematização ánti-sacerdotal, que, sem comportar nenhuma eficácia orgânica, arruinou o Politeísmo e acabou por transformá-lo em Monoteísmo.
Nesse modo extremo da Teologia, a autoridade especulativa do sacerdócio foi tão radicalmente alterada quanto o princípio de sua doutrina. Os sacerdotes perderam então o ascendente científico, como haviam perdido de inicio o ascendente estético. Conservaram somente uma supremacia moral, em breve comprometida pela emancipação intelectual, de que o espírito positivo constitui a fonte real, embora o espírito metafísico ainda lhe servisse de órgão sistemático.
Quando a Ciência se dilatou bastante para se separar também da Filosofia, ela não tardou a manifestar sua tendência necessária para uma nova unidade especulativa, não menos contrária a toda Metafísica, do que a toda Teologia. Essa construção final, naturalmente submetida a uma lenta sucessão de preâmbulos, que as duas outras não exigiam; conduzia então o espírito positivo a sistematizar a vida ativa (de onde ele emanara espontaneamente), à medida que se apoderava do domínio especulativo. Todavia, esse duplo ascendente só se pôde completar pela fundação da verdadeira Ciência social, finalmente constituída pela legitima teoria histórica.
Desde então, os verdadeiros sábios, elevando-se à dignidade filosófica, tendem necessariamente para o caráter sacerdotal, porque essa elaboração final conduz à preponderância sistemática do princípio afetivo, de onde decorre logo uma construção tão completa quanto homogênea.
Assim, os novos filósofos serão erigidos em Sacerdotes da Humanidade. A razão, a imaginação e o sentimento, se combinarão para modificarem o império da atividade prática, segundo as verdadeiras leis da Moral Universal, de que ela tende sempre a afastar-se. Esse novo Poder moderador, adquirirá tanto maior influência quanto sua sistematização tiver precedido e preparado o surto direto do regime definitivo.
O sacerdócio positivo, deve, portanto, regenerar ao mesmo tempo, todas as funções relativas ao nosso próprio aperfeiçoamento, destinando a Ciência à estudar a Humanidade, a Poesia em encantá-la e a Moral a amá-la, a fim de que, de acordo com esse irresistível concurso, a Política se aplique sem cessar a servi-la.
O culto se dirigirá a um novo Ser, o qual será devidamente servido após um conhecimento suficiente das diversas leis naturais que regem a sua existência.
Enquanto as diversas partes de nenhum outro organismo poderiam viver isoladamente, a grande existência se compõe de vidas realmente separáveis. Essa independência não impede o "consensus", mas é tão indispensável quanto o concurso à natureza de um ser, que perderia sua superioridade, se seus elementos se tornassem inseparáveis. A dificuldade de conciliar essas duas condições igualmente fundamentais, explica bastante a lentidão dessa suprema evolução.
Para completar a concepção sistemática do Grande-Ser, aí se distinguem duas ordens de funções fundamentais, umas exteriores, relativas à sua existência material, e outras destinadas a combinarem seus elementos móveis; Ora, essa divisão se reduz a estender até o organismo coletivo, a grande teoria de Bichat ,sobre a distinção das duas vidas, em todo organismo individual: a de nutrição e a de relação.
AI então, é que é necessário, apreender a verdadeira origem da separação dos dois poderes sociais. O Poder Temporal emana da personalidade e desenvolve a atividade, de onde decorre a ordem fundamental; enquanto, o Poder Espiritual, puramente moderador, representa imediatamente a sociabilidade e institui o concurso, que determina o Progresso.
Assim, na concepção do Grande-Ser, o primeiro corresponde ao aparelho nutritivo e o segundo, ao aparelho nervoso do organismo individual. À sua natureza relativa o torna eminentemente suscetível de se desenvolver: em suma, ele, que é para nós o mais vivo dos seres conhecidos, estende-se e se compõe cada vez mais pela sucessão continua das gerações humanas. Seu conjunto constitui um espetáculo imponente.
Como em relação aos fenômenos mais simples, é ao estudo sistemático do passado, que cabe determinar o futuro, para caracterizar o presente.
Da concepção normal do Grande-Ser, passamos à história de sua formação contínua, cujo conjunto resume todos os progressos. Sob uma nacionalidade primitiva, surgiu, na Idade Média, o sentimento da fraternidade universal, segundo o caráter defensivo da nova atividade militar e a livre concentração das crenças sobrenaturais, em um monarquismo comum a todo o Ocidente.
O surto dos costumes cavalheirescos e o primeiro esboço da separação normal entre os dois Poderes elementares anunciavam já a elaboração direta do grande organismo; mas a natureza quimérica e egoística das crenças dominantes, bem assim o caráter bélico e aristocrático desse regime transitório, não permitiam outra preparação além da abolição de toda escravidão pessoal, resultado principal dessa grande época. Começaram então a prevalecer os costumes industriais e o sentimento da fraternidade pôde apoiar-se sobre uma atividade verdadeiramente universal.
Pela dissolução do sistema teológico e militar, a evolução moderna fez surgir a noção real do progresso contínuo, que caracteriza a vida coletiva; mas a concepção da Humanidade só pôde constituir uma nova unidade fundamental após o abalo que, de um lado, manifestou a urgência de uma regeneração universal e, de outra parte, suscitou a Filosofia capaz de sistematizá-la. O bom senso e a Moral proscreverão em breve toda especialidade teórica que não for concebida e cultivada segundo a vista enciclopédica própria para ligá-la sempre ao conjunto de nossa existência.
Assim corrigidos de uma desastrosa sequidão, os estudos matemáticos manifestarão sempre sua secreta aptidão moral, como únicas bases reais de convicções verdadeiramente inabaláveis, que não poderiam obter nas altas especulações aqueles que não as podem atingir nas mais simples. Quando a íntima conexão de todas as nossas concepções se achar bastante apreciada, o Grande-Ser repelirá tanto o publicista que permanece estranho à Geometria como o geômetra desdenhando a Sociologia.
Da mesma forma, purificados de seu perigoso materialismo, os estudos biológicos adquiriram a imponente grandeza devida às teorias preliminares, tão aproximadas da Ciência final e próprias para prepararem o dogma fundamental. O espírito que aspirasse a compreender a Humanidade sem ter apreciado inicialmente as vitalidades inferiores, não seria menos censurável do que aquele que recusasse ligar a Biologia à sua destinação normal.
Irrevogavelmente votada ao estudo direto ou indireto da Humanidade, a Ciência tomará doravante um caráter verdadeiramente sagrado, como fundamento sistemático do culto universal. Somente ela nos pode fazer conhecer não só a natureza e condição do Grande-Ser como seu destino e tendências sucessivas.
. Sentir-se-á que, longe de ser incompatível com o sentimento, a verdadeira racionalidade pode concorrer muito para consolidá-lo e desenvolvê-lo, manifestando melhor todas as relações reais, sobretudo sociais; mas, por mais imponente que seja a grandeza que a Ciência regenerada deva assim receber do novo culto, este proporcionará à Poesia Unia consagração, mais imediata e completa, assinalando-lhe uma destinação mais ativa e mais familiar, dirigindo-se doravante o gênio estético para a Humanidade.
Só a Poesia acabará de colocar-nos no verdadeiro caminho humanista, fazendo-nos sentir devidamente todos os atributos essenciais do Grande-Ser, que nós compomos. Ela cantará alternativamente seu poder material, seu melhoramento físico, seu progresso intelectual e, sobretudo, seu aperfeiçoamento moral.
Unicamente a história do amor universal forneceria à Poesia regenerada um assunto inesgotável para representar, no indivíduo e na espécie, a progressão- que os eleva gradualmente à mais pura ternura, partindo, não obstante, de um brutal apetite.
Segundo a realidade que caracteriza o novo Ser-Supremo (A Humanidade), sua natureza relativa e modificável nos permite uma apreciação mais completa e sobretudo mais apta para nos elevar, sem cessar de nos dominar. Cada um se sente um superior, de onde depende, sob todos os aspectos, seu próprio destino, subordinado à evolução coletiva. Essa dominação de modo algum nos anula, porque cada digna individualidade se reconhece, por sua vez, indispensável ao grande organismo, sem que nenhum terror deva perturbar nosso amor em relação a ele, que nos inspira sempre uma sincera veneração. Estudamos com cuidado suas imperfeições naturais, a fim de corrigí-las tanto quanto possível. Todas estas vantagens, do novo culto só poderão ser assaz desenvolvidas pela Poesia. Goethe e principalmente Byron pressentiram a grandeza moral do homem liberto de toda quimera opressiva. Entretanto, eles só puderam chegar a tipos insurrecionais, conformes à sua missão revolucionária, mas é necessário sair do estado negativo, onde o gênio foi retido por sua situação.
Finalmente, a missão sacerdotal da Arte regenerada se desenvolverá, presidindo ao sistema de festas públicas ou privadas, que constituirá a maior parte do culto propriamente dito. Para tal atribuição, o sacerdócio deverá aplicar sua aptidão estética mais do que o talento científico, porquanto, na realidade, essa imensa função deve consistir em melhor manifestar a natureza estática e dinâmica do grande organismo, pela idealização de seus diversos caracteres.
Será preciso instituir, portanto, duas espécies de festas, nelas celebrando, ora, a existência, ora, a atividade. As festas estáticas manifestarão a ordem e estimularão o instinto de solidariedade; as festas dinâmicas caracterizarão o progresso, para fazerem melhor sentir a continuidade. Nesse complemento da educação universal, todos os princípios se encontrarão consolidados, sem intenção didática, sempre contrária ao verdadeiro gênio da Arte, que só deve instruir encantando.
As festas da ordem deverão caracterizar a solidariedade estática do grande organismo. A mais geral e mais augusta seria, portanto, a da Humanidade, que, em todo o Ocidente, inauguraria devidamente cada novo ano. Ela poderia completar-se no mesmo mês por três festas secundárias, relativas aos graus inferiores de associação: a nação, a província e a cidade. A essa celebração sucederia, no inicio de cada um dos quatro meses seguintes, a das quatro relações de família: o casamento, a paternidade, a filiação e a fraternidade, completadas no mês após por uma justa glorificação da domesticidade propriamente dita.
Os impulsos puramente pessoais aí não devem figurar distintamente, desde que tal culto é sobretudo destinado a melhor subordiná-los aos instintos altruísticos. Embora a educação positiva atribua muita importância às virtudes correspondentes, eles não merecem uma celebração especial, que impeliria ao egoísmo. Devem ser apenas indiretamente glorificados em todas as partes do culto humanista, segundo sua influência real sobre as afeições generosas. O quadro estético de nossos atributos e deveres não exige uma manifestação especial da subordinação do Grande-Ser ao conjunto do mundo exterior. Só a periodicidade de tais solenidades, segundo os movimentos do astro que nos carrega, lembra assaz nossa invencível sujeição às fatalidades exteriores.
Quanto às festas dinâmicas, consistem sobretudo na glorificação dos melhores tipos individuais das diversas fases da grande evolução. Todavia, é necessário que os principais graus da progressão social sejam celebrados abstratamente, independentemente de toda comemoração pessoal. Quatro festas eqüidistantes glorificariam as três grandes fases do passado: fetíchico, politéico e monotéico, para terminarem na festa do futuro.
O calendário positivista é um sistema completo de comemoração ocidental. Em seguida estendido aos diversos graus de regiões locais. esse sistema de glorificação individual chegaria enfim à vida privada, cujas celebrações domésticas se prenderiam às mais vastas manifestações públicas por uma dupla instituição, que se deve ao Catolicismo.
De um lado, a mais completa emancipação de modo algum altera o culto necessário da morte. Em segundo lugar, a reorganização final deverá manter e aperfeiçoar a instituição dos nomes de batismo, pela qual o regime anterior tão felizmente ligou a vida privada à existência pública, chamando cada um à imitação especial de um dos tipos consagrados.
De acordo com o duplo sistema de festas, cada semana convocará o Ocidente regenerado a uma nova celebração pública da ordem ou do progresso humano, intimamente ligada ao culto privado por uma digna adoração da Mulher. Toda essa parte estética do culto universal diretamente tenderá a desenvolver o amor fundamental, oferecendo-lhe uma expansão regular, devidamente instituída pela Poesia e, em seguida, assistida das diversas Artes especiais, relativas aos sons ou às formas. A expressão dominante será sempre a de uma sincera apreciação, motivando uma profunda gratidão, sem mistério nem afetação. Esforçando-se por exceder os seus antepassados, as populações regeneradas saberão honrar todos os seus serviços e respeitar seus diversos regimes. O sistema de comemoração será destinado principalmente a desenvolver em todos o natural desejo de eternizar nossa existência pelo único modo que nos compete.
A nobre emulação excitada pela glorificação contínua de nossos diversos predecessores impelirá cada um a merecer também essa irrevogável incorporação ao ser eterno, que se compõe muito mais de mortos do que de vivos. Nenhum digno cooperador será excluído do sistema de comemoração, por mais humilde que seja sua participação doméstica, municipal ou ocidental.
Subsistir em outrem constitui um modo muito real de existência. A incapacidade para nos colocarmos sistematicamente no ponto de vista social é que nos pode impedir de apreciar uma tal verdade, mas uma síntese completa nos abrirá em breve as imensas satisfações morais próprias do pleno surto direto dos sentimentos de solidariedade e sobretudo continuidade. Só a Poesia pode organizar o culto público e privado que nos associará intimamente à existência universal, ininteligível aos espíritos não emancipados.
Desse modo esclarecida pela razão, a imaginação tornará um surto mais completo e mais eficaz. O sacerdócio saberá reduzir a Ciência a construir o domínio fundamental da Arte, não só estética como técnica, e a Poesia se tornará a principal ocupação de nossas faculdades especulativas. Sobretudo por ela, o novo sacerdócio solenizará todas as grandes épocas individuais, principalmente o nascimento, o casamento e a morte, para fazerem prevalecer sempre uma sã apreciação dessa conexão necessária, tão conveniente à existência privada como à vida pública.
Essa consagração da Arte fundamental em breve se estenderá a todas as Belas-Artes. É ao culto da Humanidade, fundado sobre a educação positiva e instituído pela Poesia, que cabe consagrar a mais social das Artes especiais ao digno canto dos atributos e do destino de nossa espécie e, bem assim, à glorificação de todos os nossos tipos históricos. Nessa comum destinação estética, a Pintura e a Escultura utilizam nobremente sua aptidão característica, fazendo-nos conceber o Grande-Ser com maior perfeição e precisão do que o poderia a Poesia, mesmo assistida da Música.
As admiráveis tentativas realizadas, desde a Idade Média, para representarem o tipo cristão da Mulher serão consideradas preparações espontâneas para a simbolização gráfica da Humanidade, sob a forma feminina, única que lhe convém. Esse impulso social conduzirá a Escultura a superar as dificuldades técnicas que lhe oferecem as representações coletivas, em breve tornadas seu campo principal, e se elevará à sua atribuição final pela criação das estátuas compostas, não só aderentes como sobretudo separadas, que lhe permitirão abranger muito os grandes assuntos, até aqui estranhos ao seu domínio.
A participação normal da Arquitetura não será menor do que a das Belas-Artes. Essa monumental manifestação da grande unidade só se poderá tornar característica, quando o Ocidente, já familiarizado com a nova educação, acolher suficientemente o culto inspirado pela Poesia, assistida da Música e completada pela dupla Arte gráfica. Tal solicitude das populações de elite carecerá de edificações apropriadas a suas convicções finais.
Assim, nossa existência atinge finalmente, pelo reino do sentimento, a harmonia completa, que ela sempre pretendeu, dirigindo ativamente todas as nossas faculdades para sua verdadeira destinação comum. Sentimos principalmente o imenso mérito da nobre tentativa, que caracteriza a Idade Média, para constituir diretamente uma síntese total, retomando sobre melhores bases essa admirável construção.
A diversidade dos tempos e dos meios não impedirá os fundadores do culto da Humanidade de se olharem como os verdadeiros sucessores dos grandes vultos do Catolicismo progressivo. A sucessão mental ou social pertence com efeito àqueles que continuam ou realizam os empreendimentos anteriores e, de nenhum modo, aos empíricos sectários de doutrinas que já cumpriram a sua missão, as quais, tornadas contrárias à sua destinação inicial, seriam hoje desaprovadas por seus próprios órgãos primitivos. Dignamente celebrando os méritos e os benefícios do Catolicismo, o conjunto do culto positivista fará nitidamente apreciar bem a unidade que se funda sobre o amor da Humanidade.
Por isso que o amor divino exigia quase sempre o completo sacrifício de qualquer outra paixão, aquela síntese apenas servia ao surto moral, instituindo uma disciplina qualquer, preferível a uma anarquia que teria deixado prevalecerem nossos instintos mais grosseiros. Apesar dos ternos nos esforços das principais místicas, a afeição suprema absolutamente não comportava uma verdadeira reciprocidade.
Os terrores opressivos e as recompensas exorbitantes, ligados a cada prescrição, tendiam a macular nossos melhores impulsos. õ mérito fundamental de semelhante tentativa consistia em coordenar, pela primeira vez, o conjunto de nossos sentimentos, enquanto a disciplina politéica ordinariamente se limitava aos atos, remontando algumas vezes até os hábitos, sem atingir jamais as afeições, que são as suas fontes.
A síntese cristã, empregando o único princípio então aplicável, somente poderia secundar o surto de nossos melhores pendores e sua natureza vaga apenas lhe permitiu semelhante eficácia pela sabedoria sacerdotal, que continha sem cessar os perigos inerentes a esse regime arbitrário. Tal sacerdócio, tornando-se retrógrado no fim da Idade Média, perdeu ao mesmo tempo sua elevada moralidade e independência, deixando em breve degenerar sua doutrina em fonte crescente de discórdia e degradação.
A síntese positiva, fundada sobre o amor da Humanidade, não receia exame e não entrava a imaginação. Nenhum outro regime poderia estabelecer a completa preponderância da afeição sobre a contemplação e a ação. Ela erige diretamente a sociabilidade em principio único dá verdadeira Moral, que, no entanto, respeita o ascendente espontâneo da personalidade. Viver para outrem se torna assim a felicidade suprema. incorporar-se intimamente à Humanidade e pressentir seu destino futuro, concorrendo ativamente para prepará-lo, constituirá o objetivo familiar de cada existência.
O egoísmo é nossa principal enfermidade, que uma disciplina constante muito pode atenuar, mas sem poder jamais curá-la radicalmente. Semelhante império crescente sobre a nossa própria natureza torna-se a melhor medida do aperfeiçoamento, seja privado ou público.
Nossa felicidade consistirá principalmente em amar e sentiremos que o amor, mais do que nenhuma outra afeição, se desenvolve por um exercício que, de igual modo, pode convir a todos os indivíduos ao mesmo tempo, crescendo com o aludido concurso.
Enquanto a antiga Divindade não se poderia aprazer com as nossas homenagens sem se degradar por uma vaidade pueril, o Grande-Ser acolherá nossos merecidos louvores, que o melhorarão tanto como a nós mesmos. Esta plena reciprocidade de afeição e de influência só podia pertencer ao culto final, que se dirige a um ser relativo, modificável e perfectível, composto de seus próprios adoradores e melhor sujeito do que cada um deles, a leis assinaláveís, que permitem prever suas aspirações e tendências.
A Moral correspondente reúne todos os atributos da espontaneidade a todas as vantagens da demonstração. Embora ela pareça inicialmente mais terna do que enérgica, o amor que a inspira jamais é inerte e impele com ardor à mais completa atividade que comporta a realização do bem que ele prossegue sempre. Esclarecido pela verdadeira Ciência, ele sente constantemente que devemos constituir pela atividade contínua a única providência que possa melhorar nosso rigoroso destino. O grande organismo reconhece que sua existência, subordinada a leis imutáveis, não comporta uma satisfação nem mesmo uma segurança absolutas.
Todas as nossas condições reais, exteriores ou interiores, podem achar-se comprometidas, sem excetuar a moralidade e a razão, de onde emanam os nossos principais recursos. É no meio de tais eventualidades, sempre possíveis, que é necessário encontrar a força de viver dignamente, isto é, amar, pensar e agir para o Grande-Ser.
O regime positivo faz surgir uma viva satisfação de nossa luta, mesmo insuficiente, contra os rigores de um destino que não, é sempre imodificável. A reação afetiva de tal necessidade torna-se uma nova fonte de intimo aperfeiçoamento, afastando uma previdência exagerada tanto como uma fátua indiferença. Resignar-se a todos os males insuperáveis e intervir em todos os casos modificáveis é o caráter prático da existência positivista, individual ou coletiva.
O crescente ascendente que a suave criação estética da Virgem obtém, desde o século XII, não pode atrair uma adoração direta e privilegiada sem alterar radicalmente o culto onde ela surgiu. Ela é adequada a servir de intermediário entre o regime moral de nossos antepassados e o de nossos descendentes, transformando-se pouco a pouco em personificação da Humanidade.
Todavia, essa feliz transição não poderia emanar do sacerdócio oficial, mesmo italiano ou espanhol. Ela encontrará mais puros órgãos na intervenção feminina, que deve propagar o Positivismo entre nossos irmãos do, Meio-dia.
A superioridade da Moral demonstrada sobre a antiga se resume na instituição do amor da Humanidade. Amar a Humanidade constitui realmente toda a sã Moral, quando se compreenderem os verdadeiros caracteres de tal amor e as condições que exige seu ascendente habitual.
Essa ativa preponderância da sociabilidade sobre nossa personalidade fundamental só pode resultar de uma lenta e difícil educação do coração secundado pelo espírito. A principal preparação consiste na ternura mútua dos dois sexos, precedida e seguida das outras afeições domésticas; mas todas as partes da Moral, mesmo pessoal, podem ligar-se também ao amor da Humanidade, que fornece a melhor medida de sua importância real e o mais seguro meio de estabelecer então preceitos incontestáveis. O principio da sistematização coincide com o da espontaneidade, o que torna a doutrina universal igualmente acessível a todos.
Desse modo regeneradas por uma mesma Religião, a Ciência, a Poesia e a Moral tendem a formar uma combinação inalterável, sobre a qual repousará nosso novo, destino. É o que tentou a Idade Média, segundo sua unidade teológica. Então, o Poder moderador começou a se compor de seus dois elementos necessários, um afetuoso e privado, o outro sistemático e público. Apesar da salutar influência que exerceu durante muito tempo esse primeiro esboço, ele só podia constituir um simples preâmbulo, porque repousava sobre uma síntese insuficiente e efêmera.
Sem o concurso da superioridade intelectual, o ascendente moral não poderia constituir o verdadeiro Poder espiritual, capaz de moderar a enérgica preponderância da força material, motivo por que a condição fundamental de uma verdadeira reorganização consistia em terminar a insurreição radical do espírito contra o coração, que dura desde a última fase da Idade Média e cuja origem remonta até o surto da Metafísica grega. A sistematização positiva supera essa imensa dificuldade, constituindo a Ciência final, segundo todas as Ciências preliminares, de modo a estabelecer a unidade especulativa.
Livres das necessidades materiais, que dominam nossa existência, dispensados de uma penosa atividade, prosseguiríamos diretamente o bem supremo, o amor universal. Quando semelhante utopia for assaz elaborada pelo gênio. estético, ela oferecerá ao novo culto recursos superiores aos que o antigo retirava de sua vaga e quimérica representação da felicidade futura. Só a ela convém a classificação social fundada sobre o mérito intelectual e moral, independentemente de todo poder material. Então, os indivíduos somente seriam apreciáveis de acordo com a respectiva aptidão para amar e encantar a Humanidade.
Todavia, essa reação normal deverá respeitar sempre as leis naturais relativas à repartição da grandeza e da riqueza para melhorar seu exercício, sem perturbar sua destinação prática. Essa conciliação exige que a classificação abstrata se limite aos indivíduos, deixando uni livre curso à subordinação concreta das diversas funções. A verdadeira proeminência pessoal é de tal modo rara que a vida social se consumiria em debates estéreis e intermináveis, se pretendesse conferir sempre cada função a seu melhor órgão, de maneira a destituir muitas vezes o funcionário primitivo, sem considerar as condições de exercício.
Semelhante tendência seria profundamente perturbadora, mesmo na hierarquia espiritual, onde a aptidão é melhor suscetível de julgamento; mas, sem nenhum perigo político, há sempre muitas vantagens morais em manifestar, em cada caso decisivo, quanto diferem a ordem do poder e a do mérito. A estima assim concedida ao mais digno de modo algum compromete a autoridade do mais poderoso.
Embora São Bernardo fosse mais considerado do que nenhum papa dentre os seus contemporâneos, ele sabia respeitar sempre, como simples abade, a hierarquia eclesiástica. São Paulo já caracterizara tal dever, reconhecendo a supremacia oficial de um apóstolo do qual ele não podia dissimular a inferioridade de espírito e de coração. As corporações civis ou militares oferecem exemplos de uma semelhante conciliação entre a ordem abstrata dos indivíduos e a ordem concreta das funções.
Assim, um poder intelectual e moral bastaria para governar-nos, se nos achássemos libertos de toda grave necessidade material. A sociabilidade prevaleceria então por seu próprio encanto. Sob o impulso preponderante das necessidades irresistíveis, nossa existência é, no entanto, dominada por uma atividade egoísta, à qual a razão, a imaginação e mesmo o sentimento devem subordinar seu surto direto e o duplo poder, que parecia destinado a dirigir, não deve mais tender senão a modificar. Seu elemento afetivo sofre facilmente essa necessidade, porque o coração sempre se esforça para realizar o bem, quando. lhe conhece as verdadeiras condições.
Na realidade, porém, o espírito não poderia ser tão sensato e dificilmente se resigna a servir ao invés de reinar. Sua vã ambição perturba mais o mundo do que aquela que ele tanto censura à grandeza e à riqueza. Hoje, nosso principal obstáculo consiste em regulá-la, assegurando-lhe uma legitima satisfação, a fim de que o Poder teórico seja verdadeiramente moderador, sem querer jamais tornar-se diretor.
Essa regeneração decisiva consiste sobretudo, em substituir os direitos pelos deveres, para melhor subordinar a personalidade à sociabilidade. A palavra direito deve ser tão afastada da verdadeira linguagem política, quanto a palavra causa, da linguagem filosófica. Dessas duas noções da Metafísica teológica uma é doravante imoral e anárquica como a outra, irracional e sofística. Igualmente incompatíveis com o estado final, elas, entre os modernos, apenas convinham à transição revolucionária por sua ação dissolvente sobre o sistema anterior. Somente puderam existir verdadeiros direitos, enquanto os poderes regulares emanaram de vontades sobrenaturais.
Para lutar contra as autoridades teocráticas, a Metafísica dos séculos XIV a XVIII introduziu pretensos direitos humanos, que só comportavam uma função negativa. Quando se tentou dar-lhes uma destinação verdadeiramente orgânica, eles manifestaram em breve sua natureza anti-social, sempre tendendo a consagrar a individualidade.
No estado positivo, que não admite títulos celestes, a idéia de direito desaparece irrevogavelmente. Cada um de nós tem deveres em relação a todos, mas ninguém possui nenhum direito propriamente dito. As justas garantias individuais somente resultam da universal reciprocidade de obrigações, que reproduz o equivalente moral dos direitos anteriores, sem oferecer seus graves perigos políticos. Em outros termos, ninguém possui mais nenhum direito senão o de cumprir sempre o seu dever. Somente assim a Política poderá finalmente subordinar-se à Moral, segundo o admirável programa da Idade Média.
O verdadeiro amor absolutamente não se limita a desejar o bem; impele a realizá-lo tanto quanto possível. O Ser Supremo concebido pela antiga Teologia não tinha, na verdade, nenhuma necessidade de nossos serviços. Assim, o quietismo decorrente do antigo culto só pôde ser contido quando a sabedoria sacerdotal, feliz órgão do instinto universal, se aproveitou do vago dessas teorias para prescrever a atividade. Ao contrário, na nova sistematização, a própria doutrina impele diretamente à mais vasta atividade.
No Positivismo, o principal caráter de seu serviço fundamental consiste em uma imensa cooperação. Esse "consensus" suscita os dois graus necessários do sentimento social, apreciando inicialmente a solidariedade atual e, em seguida, a continuidade histórica. O estudo de cada fenômeno social, estático ou dinâmico, manifestará sempre o' concurso de todas as existências contemporâneas e de todas as gerações anteriores, entre certos limites geográficos e cronológicos, que se afastam à medida que o Grande-Ser se desenvolve. Incontestável quanto aos nossos pensamentos e afeições, essa cooperação necessária deve convir ainda mais às nossas ações, cujos resultados exigem um concurso mais completo.
A noção do direito propriamente dito supõe sempre a individualidade absoluta. A subordinação real da Política à Moral resulta diretamente de que todos os homens devem ser concebidos, não, como seres separados, mas como diversos órgãos de um único Grande-Ser. Também, em toda sociedade regular, cada cidadão foi sempre erigido em um funcionário público, preenchendo bem ou mal sua função.
Sem a intervenção científica, completada pela função estética do novo sacerdócio, o sentimento social jamais poderia desenvolver-se bastante para modificar profundamente a conduta habitual, por isso que ele assim ficaria limitado à simples solidariedade atual. Em cada fenômeno social, sobretudo moderno, os predecessores participam mais do que os contemporâneos. Os trabalhos materiais, dependendo de um concerto mais vasto, são ainda mais próprios para confirmarem a íntima realidade de tal apreciação,.
Semelhante continuidade manifesta que a vida individual só pode existir por abstração. Nossa sociabilidade dai retira seu principal caráter, porque muitos outros animais sentem a cooperação simultânea, enquanto somente nós apreciamos e desenvolvemos a cooperação sucessiva, primeira fonte de nossa evolução gradual. O sentimento social permanece, portanto, muito imperfeito ou mesmo perturbador, quando se limita às relações atuais. Todas as aberrações hostis a uma hereditariedade qualquer repousam hoje sobre esse vicioso desdém da continuidade histórica.
Os utopistas sinceros reconhecerão que a solidariedade não pode ser mesmo sentida sem a continuidade. Com efeito, de uma parte a iniciação pessoal reproduz espontaneamente as principais fases da evolução social. De outro lado, os estados sucessivos do Grande-Ser reaparecem hoje nas diversas populações que ainda não estão incorporadas a ele, de sorte que não se pode simpatizar devidamente com elas, sem respeitar inicialmente o encadeamento das fases ocidentais.
O verdadeiro sentimento social não pode, assim, consolidar-se e desenvolver-se sem essa grande base científica - o conjunto dos estudos históricos, que depende do das especulações positivas.
Este será, sob o ponto de vista racional e afetivo, o primeiro fundamento da inevitável separação dos dois Poderes elementares.
À medida que o aperfeiçoamento da Humanidade se tornar o principal objetivo de sua atividade, mais se sentirá que não se podem modificar tais fenômenos, sem lhes conhecer as leis naturais.
Semelhante estudo só poderia emanar de uma classe eminentemente contemplativa, devotada a essa difícil apreciação e investida não só da autoridade consultiva que dela resulta como da atribuição didática indispensável à sua destinação. Se, em relação às Artes mais singelas, a razão ocidental já reconheceu que a teoria só pode ser cultivada e ensinada por pensadores estranhos à prática, ela não poderia tardar a prescrever uma semelhante divisão quanto à Arte mais difícil e mais importante, a fim de concentrar o seu estudo entre os verdadeiros filósofos.
Essa separação sistemática torna-se também a base necessária da Sã Política moderna sob um segundo aspecto fundamental, tão indispensável à digna atividade pessoal, quanto à sábia cooperação social. Com efeito, o GrandeSer não é menos caracterizado pela independência de seus diversos elementos, individuais ou melhor domésticos, do que por seu concurso universal.
Na Antigüidade, a independência era habitualmente sacrificada ao concurso, o qual depende sobretudo de uma livre adesão do coração e espírito a uma doutrina universal, que, sem arbitrariedade, impõe regras gerais de conduta, relativas ao mando e, bem assim, à obediência.
A natureza da nova fé, suscetível de demonstração, tornará essa espiritualidade muito superior à antiga, não só em dignidade como em estabilidade. Tal conciliação entre a independência e o concurso, que constitui a verdadeira liberdade, só se pode realizar obedecendo a leis objetivas, desprendidas de toda inspiração subjetiva e, desde então, acessíveis sempre a verdadeiras demonstrações. Este será o imenso benefício social do gênio científico convenientemente estendido aos fenômenos mais complexos e mais importantes.
As leis naturais tornam-se a base necessária de nossa ativa intervenção. Quanto melhor forem elas conhecidas a tanto mais nossa conduta se libertará de todo mando arbitrário e de toda obediência servil. Na verdade, essas regras exteriores raramente podem ser assaz determinadas, para dispensarem, em cada caso, prescrições imperativas.
É então ao coração que cabe suprir, de uma parte e de outra, à insuficiência do espírito, dispondo a realizar por afeição as injunções muito pouco motivadas. Sem poder evitar sempre as vontades arbitrárias, basta à nossa dignidade que elas sejam subordinadas à uniformidade das leis exteriores, por isso que a razão e o sentimento tendem constantemente a lhes reduzir o domínio cotidiano.
No regime positivo, a vida industrial e o espírito científico concorrem para tornar cada um de nós independente de todo capricho individual e, ao mesmo tempo, melhor aderente ao organismo universal.
Das utopias metafísicas, onde se supõe a sociedade destituída de qualquer impulso espontâneo, indefinidamente entregue às vontades legislativas e o concurso só se obtém destruindo a independência como na Antigüidade, só se pode esperar opressão e degradação.
A atividade contínua do Grande-Ser se refere à sua condição exterior ou à sua própria natureza. Essa elaboração perpétua tende em breve a depender mais do concurso sucessivo das gerações do que do concurso simultâneo dos indivíduos. Cada geração produz materiais além de suas próprias necessidades, para o fim de facilitar o trabalho e preparar a subsistência da seguinte.
Quanto ao ascendente prático, ele se estabelece tanto melhor quanto os capitais naturalmente tendem à acumulação entre administradores prudentes e hábeis. Estes são os chefes temporais da sociedade moderna.
O culto final deve consagrá-los como os órgãos nutritivos do Grande-Ser, quer eles recolham e preparem os materiais assimiláveis, quer os distribuam por toda parte, sob o impulso contínuo de um aparelho central. Ufanos de sua importância direta e quotidiana, impelidos pelos instintos pessoais, únicos que, ordinariamente, podem estimular sua atividade ininterrupta, eles tendem a abusar de sua preponderância prática para imporem o jugo de uma ignóbil necessidade, inacessível ao sentimento e à razão. Por esse motivo, seu império espontâneo carece de ser moderado incessantemente pelo concurso das forças morais. Tal é a principal destinação política da segunda função geral do Grande-Ser.
Após a combinação da influência feminina com o poder filosófico, a qual se torna tão indispensável ao organismo coletiva quanto o é, em relação ao indivíduo, a função especulativa do cérebro, a maturidade do Grande-Ser acrescenta-lhe uma terceira, que completa essa organização e constitui a principal base de sua intervenção política, fazendo surgir finalmente a função ativa do cérebro social: a influência proletária.
No que se refere aos chefes temporais da sociedade moderna, doravante erigidos em verdadeiros funcionários públicos, encarregados da administração dos capitais e direção dos trabalhos materiais, é necessário honrar e consolidar seu precioso concurso, ao invés de degradá-lo ou comprimi-lo. Quando o novo sacerdócio tiver exaurido, junto a eles, os meios de convicção e persuasão resultantes da educação universal, poderá recorrer à censura sistemática, à qual a adesão popular e a sanção feminina oferecerão uma temível eficácia. Para reprimir os desvios extremos, poderá aplicar a excomunhão social. Mas, mesmo então, a repressão deve ser puramente moral. Se por exceção, o abuso exigir medidas políticas, o Poder temporal será único juiz delas.
Apesar das recriminações metafísicas contra a transmissão hereditária das riquezas materiais, essa disciplina moral conterá quase todos os abusos desse modo natural. Substituindo os direitos pelos deveres, pouco haverá como preocupar-se com os possuidores atuais de uma força qualquer, contanto que seu exercício seja bem regulado. Aliás, a nova doutrina fará ressaltar as vantagens sociais de semelhante sistematização, quanto a funções que, não exigindo nenhuma rara capacidade, melhor comportam a simples aprendizagem doméstica. Principalmente sob o aspecto moral, os homens sempre habituados à riqueza são mais suscetíveis de generosidade do que aqueles que a acumularam lentamente, mesmo com dignidade.
Assim, o modo que inicialmente se aplicava a todas as funções, pode convir indefinidamente às que supõem menos habilidade especial, quando elas se limitam à conservação dos capitais, sem participar de seu emprego. Se instituíssem outros conservadores, o serviço público não seria melhor garantido.
A Indústria moderna já constatou a superioridade administrativa dos diretores privados, aos quais tendem a passar todos os encargos sociais que comportarem essa transformação, somente interdita quanto às funções teóricas, para serem investidas do caráter coletivo. Declamações invejosas contra as fortunas hereditárias não poderiam imipedir seus possuidores, de se tornarem muitas vezes os mais úteis órgãos da Humanidade, contanto que uma sábia educação, convenientemente assistida pela opinião universal, disponha para o bem os naturalmente afortunados.
Os únicos interesses materiais que a força moral deva debater com o poder político se acham regulados por dois princípios gerais, resultantes de uma exata apreciação da ordem natural. De um lado, o homem deve sustentar* a mulher, de outra parte, a classe ativa (proletária e a patronal), deve manter a classe contemplativa (sacerdotal). Tais são as duas condições fundamentais que, evidentemente, impõe a natureza do Grande-Ser, a fim de que suas funções afetivas ou especulativas se possam realizar devidamente. A felicidade privada e o bem público dependem muito da preponderância do sentimento sobre a razão e a atividade para que sejam adquiridos pelo preço da inação industrial de uma metade de nossa espécie.
*Sustentar, sem tirar a forşa polİtica da Mulher. Prestigiando-a materialmente e moralmente, para que ela execute o trabalho mais importante, que Ú o da educaşÒo dos sentimentos altruİstas
dos filhosNas tribos mais simples, o sexo ativo aceita, sob esse aspecto, uma obrigação continua, que distingue o amor humano do simples desejo animal.
No que respeita à outra condição, o antigo sacerdócio a consagrou desde muito tempo. Para que a separação normal dos dois poderes seja plenamente estabelecida, é necessário que os novos filósofos fiquem estranhos à fortuna e à dominação; eles não devem ser mais ricos do que os proletários, na proporção das conveniências próprias de sua atribuição social. É sob esse duplo título que eles poderão proclamar opiniões e conselhos de cuja pureza jamais se duvidará.
Portanto, em sua administração normal da riqueza comum, os chefes temporais deverão satisfazer a essas duas condições necessárias ao regulamento privado dos salários industriais e à retribuição pública dos trabalhos teóricos, sem os quais o equilíbrio prático não será estável. Farão acordo o espírito e o coração para que se dissipem as ignóbeis paixões e as doutrinas subversivas que hoje suscita um poder que, na realidade, desconhece suas grandes obrigações morais.
Somente tais prescrições, que deixam a cada um o mérito de uma execução voluntária, permitem aos ricos evitar a tirania política que hoje os ameaça. Então, a livre concentração das fortunas será geralmente apreciada como indispensável à sua plena eficácia, sobretudo social, porque grandes deveres supõem grandes forças.
É assim que o aparelho nutritivo funcionará convenientemente para todos os órgãos do Grande-Ser. Renunciando a lutas muito legitimas, mas efêmeras, o povo desenvolverá devidamente suas disposições naturais para a veneração, subordinando-se ordinariamente a seus chefes temporais e confiando nos espirituais.
Os proletários sentirão que a verdadeira felicidade, de nenhum modo peculiar à riqueza, depende sobretudo das satisfações intelectuais, morais e sociais, a que eles são chamados mais do que seus superiores.
Renunciarão eles, sem pesar, ao gozo da cupidez e dominação, que constituem a recompensa natural dos instintos de onde emana a estimulação prática. Após a conscienciosa realização de sua atribuição especial, cada um deles não terá outra ambição além de executar devidamente sua função geral como auxiliar ativo do poder teórico, concorrendo para formar, por meio de sensatas discussões quotidianas, a verdadeira opinião pública.
Esclarecido quanto às verdadeiras condições do governo espiritual, o povo reservará a sua confiança para um sacerdócio disposto sempre a subordinar o espírito ao coração, garantindo a moralidade da Ciência real por uma constante abnegação temporal.
Aos filósofos, a educação e, por conseguinte, o conselho; aos chefes industriais, a ação e, inicialmente, o mando. Esta é a repartição normal, indispensável à harmonia do Grande-Ser. Mas a renovação final das instituições sociais, exige a reconstrução prévia das opiniões e costumes. Nesse interregno, a Política deve ser essencialmente provisória. embora dominada pela consideração do estado final. Reconhecido só existe agora o princípio afetivo do novo regime: a subordinação contínua da Política à Moral. Ela constitui, com efeito, o verdadeiro sentido orgânico da proclamação da República francesa, consagrando todas as existências ao serviço da Humanidade.
A parte negativa da Revolução se resumiu numa divisa profundamente contraditória.- Liberdade- lgualdade, que repelia toda organização real, por isso que um livre surto desenvolve necessariamente as diferenças quaisquer, sobretudo mentais e morais. Então, para manter o nível, é necessário comprimir sempre a evolução.
Naquela fórmula inicial, o ódio ao passado substituía a concepção do futuro. Sua tendência progressiva moderava sua natureza anárquica, a ponto de inspirar a primeira tentativa direta para fundar a verdadeira Política sobre o conjunto da História, no imortal, apesar de malogrado, esboço de Condorcet. Assim, a preponderância final do espírito histórico já se anunciava sob o principal ascendente de um espírito anti-histórico.
A longa retrogradação que deveu seguir esse abalo decisivo jamais comportou verdadeira divisa, segundo a secreta antipatia que ela inspirou sempre aos cérebros pensantes e aos corações enérgicos. Ela não podia deixar outros resultados duráveis além da convicção universal da impotência orgânica da Metafísica revolucionária e a necessidade da elaboração histórica. Apesar da completa ausência de convicções sociais, ela não impedirá absolutamente os bons espíritos e os corações honestos de adotarem espontaneamente a divisa sistemática do futuro: Ordem e Progresso.
Tal divisa concede diretamente à ordem a proeminência que lhe convém e sem a qual não pode abranger o conjunto de seu domínio natural, ao mesmo tempo público e privado, teórico e prático, moral e político, associando-lhes o progresso, como finalidade e manifestação da ordem.
A combinação da divisa sistemática do futuro com seu princípio fundamental não poderia bastar para começar hoje a Política definitiva, que supõe a terminação prévia do interregno espiritual. Durante essa grande elaboração, é necessário instituir uma Política provisória, destinada a manter, no interior e no exterior, a ordem indispensável à transição ocidental; ela será caracterizada por uma íntima colaboração entre o pleno surto da liberdade de exposição ou discussão e a preponderância prática do Poder executivo, devidamente regenerado.
Tratando-se principalmente de moralizar a vida ativa, deve-se conceder a preponderância política ao elemento prático, melhor acessível, pelo espírito e coração, à influência moral. Seu ascendente político, deixando um livre curso a seus chefes civis, preparará seu advento normal, fazendo-lhes sentir a necessidade de uma íntima regeneração, privada e pública, sem a qual eles ficariam indignos de sua supremacia final.
Um "Diretório Positivista Ocidental" reunirá práticos e teóricos, manifestando a coalizão fundamental entre os filósofos e os proletários, e se comporá, em seu núcleo primitivo, de trinta membros, aos quais se deverão juntar seis damas. Além de sua influência normal, sua participação especial se torna indispensável para fazer propagar convenientemente o pensamento e a Moral positiva.
Enquanto os diversos governos nacionais mantiverem a ordem material, esses livres precursores do regime final presidirão à elaboração ocidental que dissipará gradualmente o interregno espiritual, único obstáculo essencial à regeneração social. Portanto, eles deverão secundar o desenvolvimento e a propagação do Positivismo assim como sua aplicação crescente por todos os meios honrosos de que puderem dispor. Além do ensino, oral e escrito, popular e didático, esforçar-se-ão sobretudo para inaugurarem tanto quanto possível o culto final da Humanidade, já suscetível de esboço imediato, pelo menos quanto ao sistema de comemorações. Sua influência política poderá mesmo indicar ,diretamente a ocidentalidade característica do novo regime, fazendo adotar em toda parte algumas medidas comuns, cuja utilidade é reconhecida desde muito tempo, mas que jamais puderam prevalecer, por falta de um órgão central, superior às rivalidades nacionais.
Tal seria sobretudo a instituição da Marinha ocidental, destinada não só à universal polícia marítima como às explorações teóricas ou práticas. Livremente recrutada em todos os ramos da grande família, ela representaria nos mares a admirável Cavalaria da Idade Média. Seu pavilhão naturalmente constituiria a primeira manifestação solene da divisa positivista.
Essa primeira medida característica lhe suscitaria naturalmente uma segunda, que consistiria em fazer sancionar pelos diversos poderes temporais a moeda única, destinada a facilitar, em todo o Ocidente. as transações industriais.
Deve ser mencionada a livre fundação de um Instituto ocidental, para o fim de constituir o núcleo sistemático de uma verdadeira classe contemplativa. Destinando-se ao sacerdócio final, esses novos filósofos introduziriam o ensino setenário em todas as localidades dispostas a acolhê-lo.
Quanto ao pavilhão religioso, ao mesmo tempo ocidental e nacional, estendido em quadro representará, na sua face branca, o símbolo da Humanidade, personificada por uma mulher de trinta anos, tendo o filho entre os braços A outra face conterá a fórmula sagrada dos positivistas: O Amor por princípio, a Ordem por base e o Progresso por Fim sobre um fundo, verde, cor natural da esperança, própria dos emblemas do futuro.
A bandeira política, devendo flutuar em pavilhão, conterá sobre as duas faces verdes as duas divisas que caracterizam o Positivismo: uma política e científica, Ordem e Progresso ; a outra moral e estética, Viver para outrem.
Desta bandeira ocidental deduzir-se-á facilmente a que deve distinguir cada nacionalidade, acrescentando-lhe uma simples orla, com as cores atuais da população correspondente. (I)
Todavia, não deve ser esquecido que o Grande-Ser só estará plenamente formado após a universal identificação de seus órgãos quaisquer. Entre a simples nacionalidade, que o gênio social da Antigüidade jamais esqueceu, e a Humanidade definitiva, a Idade Média instituiu um intermediário hoje muito desconhecido, fundando uma livre ocidentalidade.
Agora, nosso primeiro dever político consiste em reconstruí-Ia sobre bases inabaláveis, reparando a anarquia suscitada pela extinção do regime católico e feudal, como uma última preparação para a verdadeira Humanidade.
As leis fundamentais da evolução humana, que estabelecem a base filosófica do regime final, convêm a todos os climas e raças, salvo simples diferenças de velocidade. Esses retardamentos explicáveis se devem compensar doravante por um surto melhor sistematizado, isento dos perigos e oscilações próprios do empirismo da marcha original.
O Diretório positivista atingirá provavelmente composição final de sessenta membros, antes da terminação do interregno espiritual no centro do Grande-Ser. Todavia, mesmo considerando que a reorganização temporal virá secundar, em seguida, tanto quanto possível, as cinco fases necessárias, que sucessivamente oferecerá tal expansão, não é possível supô-la decisiva antes de dois séculos.
Mas essa atribuição sistemática comportará em breve uma eficácia crescente não só quanto à preparação direta das populações retardadas, como sobretudo confirmando a grande família de elite em sua nova fé, assim chamada a manifestar sua universalidade característica.
(l) - A República brasileira, proclamada a 15 de novembro de 1889, instituiu a bandeira nacional contendo a divisa "Ordem e Progresso". Foi assim o Brasil a primeira nação do Ocidente a inscrever em sua bandeira o lema constituído por Augusto Comte para resumir a Política moderna.
Todas as qualidades do admirável regime da Idade Média devem ser consolidadas e aperfeiçoadas pelo Positivismo, somente o qual conduz enfim o espírito a aceitar irrevogavelmente a justa dominação do coração. Nossos generosos e cavalheirescos antepassados aplicaram devidamente a melhor doutrina que o seu tempo comportava, mas a nova doutrina fará sentir aos espíritos retos e aos corações puros sua superioridade, não só quanto à afeição e imaginação como à razão e atividade.
Desenvolvendo todo o encanto próprio de seu estudo e celebração e sempre caracterizando-se pela realidade e utilidade, a nova Religião não comportará nenhuma degeneração ascética nem quietista. O Amor, que nela tudo comanda, não poderia ser passivo: ele só estimula a razão e, sobretudo, a imaginação para melhor dirigir a atividade, de onde emanou a positividade, em seguida estendida ao domínio contemplativo e, finalmente, à vida afetiva.
Desse modo, nossa existência é devotada ao aperfeiçoamento contínuo da ordem natural, a princípio quanto à nossa condição material, depois quanto à nossa própria natureza, física, intelectual e moral. Sua finalidade característica desde então consiste no progresso moral, ao mesmo tempo pessoal, doméstico e social, como simples fonte da felicidade privada e do bem público.
Na Idade Média, o Catolicismo começou a sistematização direta da Moral universal. Toda a eficácia efêmera dessa grandiosa tentativa resultou de uma primeira separação entre o Poder moral e o político, sempre confundidos na Antigüidade. Ora, semelhante divisão, resultado empírico da situação, deveu então malograr-se como contrária ao espírito da doutrina e modo de sociabilidade. Apesar das simpatias femininas, o regime católico, onde faltava a enérgica assistência dos proletários, sucumbiu em breve sob a usurpação temporal, secundada pela degeneração sacerdotal.
A Religião final formula diretamente o sagrado problema humano (a preponderância habitual da sociabilidade sobre a personalidade). Tanto quanto o comporta a extrema imperfeição de nossa natureza moral, ele será resolvido de acordo com o surto geral e contínuo das afeições de família, que constituem a única transição real dos instintos egoístas aos pendores universais.
Para consolidar e desenvolver essa solução radical, é finalmente estabelecida a separação normal entre o Poder teórico e o Poder prático: um geral e consultivo, só preside à educação; o outro, especial e imperativo, dirige sempre a ação. Todos os elementos sociais, que naturalmente são excluídos do governo propriamente dito, se tornam as garantias necessárias dessa constituição fundamental. órgãos sistemáticos do Poder moderador, os verdadeiros filósofos poderão contar sempre com a adesão feminina e a assistência popular, em suas divergências legítimas contra o Poder diretor.
Todavia, esse duplo apoio jamais será obtido senão por aquele que, às condições prescritas pela natureza da Arte de regenerar, puder juntar as qualidades morais ainda mais indispensáveis, provando possuir um coração tão generoso como o da mulher e tão enérgico quanto o do proletário. A primeira garantia de tal aptidão consiste numa sincera renúncia ao mando e mesmo à riqueza. Então, a nova Religião substituirá a antiga, preenchendo melhor toda a sua destinação real, não apenas social como ainda mental.
Não é mais somente em nome da razão desenvolvida que os novos filósofos devem agora impelir todos os sectários equívocos a escolherem entre a vã investigação das causas e o estudo real das leis, entre o regime das vontades arbitrárias e o das necessidades demonstráveis.
É sobretudo o sentimento que fará prevalecer a verdadeira sociabilidade.
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Tradução de Antonio Valença de Mello - Política Positiva de Augusto Comte - Livraria Civilização Brasileira 1979.