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HUMANIDADE
A
DEUSA
DO
FUTURO
Oração proferida na Igreja Positivista do Brasil, a 1º de Moisés de 182. 0l de janeiro de 1970.
Por Alfredo de Moraes Filho -194 - 1982
EXPLICAÇÃO NECESSÁRIA
Em virtude do crescente interesse que o Positivismo vem despertando nestes últimos anos, resolvemos editar a oração que proferimos, na Igreja Positivista do Brasil, no dia da Humanidade, no ano 182 da era positivista. * - 1º de Janeiro de 1970.
Essa era se inicia no ano em que Paris, resumindo os anseios de todos os povos, pôs o problema da reforma social, sem ficções nem privilégios, baseada no conhecimento científico do mundo e do homem, e sob o impulso do amor universal.
Coube ao gênio incomparável do reformador social de nossos dias, Augusto Comte, sistematizar, após duas gerações, tamanhas transformações, Meditando já sob a influência do coração feminino, resumido no de Clotilde de Vaux, sua inspiradora e colega, pôde Augusto Comte perceber que tais reformas atingiam a coordenação máxima do espírito humano - a Religião.
Percebeu que todas as modalidades que se apresentou através dos tempos a religião, nada mais foram que soluções adequadas aos tempos e lugares para resolver o ingente problema da unidade humana, pessoal e social.
Ligar o interior de cada pessoa em tomo do amor, e religar todas as pessoas em tomo de uma Existência Superior, eis o fim real da religião, conseguido transitoriamente pelas religiões anteriores, em tomo de Fetiches, de Deuses ou de Deus, e que, no futuro será obtido em torno da nova Deusa - a Humanidade.
Extinctis Deus succedis Humanitas, segundo a profunda máxima usada por Miguel Lemos, fundador do Templo Positivista do Brasil, a quem rendemos nosso preito de entusiasmo e gratidão.
Rio de Janeiro, Bichat de 194, dezembro de 1982.
A era positivista começa no dia 1º de janeiro de 1789, ano da Tomada da Bastilha.
FESTA DA HUMANIDADE
Cerimônia realizada no dia 1º de Moisés de182 / 19 de Janeiro de 1970.
Com todos os centros de nossa fé onde quer que existam, com todos os seus discípulos esparsos, com os fiéis de todas as outras religiões ou crenças quaisquer, Monoteistas, Politeístas ou Fetichistas, subordinando todas as distinções secundárias ao laço exclusivo de uma aspiração religiosa comum; com toda a espécie humana, isto é, com o homem, onde quer que se ache e qualquer que seja a sua condição, subordinando também todas as distinções secundárias ao laço único de nossa comum Humanidade; com as raças animais que foram, durante a longa e trabalhosa ascensão humana, os nossos companheiros e auxiliares, como ainda o são; - estejamos hoje, nesta festa da Humanidade, unidos por uma consciente simpatia.
E não somente com os nossos contemporâneos que devemos hoje estar em comunhão simpática, mas também e sobretudo com essa parte preponderante de nossa espécie que representa o Passado.
Comemoremos com reconhecimento os serviços de todas essas gerações que nos legaram o fruto de seus labores, desejando transmitir esta aumentada herança aos nossos sucessores. Nós aceitamos o jugo dos mortos.
Comemoremos também com gratidão todos os serviços de nossa Mãe comum, a Terra, o planeta que nos serve de morada, e com ela o orbe que forma o Sistema Solar, o nosso Mundo. Não separemos desta última comemoração a do meio em que colocamos esse sistema, o Espaço, que foi sempre tão propício ao homem, e que está destinado, mediante uma sábia aplicação, à prestar-lhe ainda maiores serviços, pois que ele se torna a sede reconhecida da abstração, a sede das leis superiores que coletivamente constituem o Destino do homem, e como tal introduzido em toda a nossa educação intelectual e moral.
Do presente e do passado estendamos as nossas simpatias ao futuro, às gerações futuras que com sorte mais feliz nos sucederão sobre a Terra; tenhamo-las sempre presentes ao nosso espírito, a fim de completar a concepção da Humanidade, tal como nos foi revelada pelo Fundador de nossa Doutrina, pela plena aceitação da continuidade que constitui o seu mais nobre característico.
Com as palavras abaixo, abria, anualmente na Igreja Positivista de Londres o apóstolo Richard Congreve, a Festa da Humanidade :
"Vós todos, manes veneráveis, constituis uma existência única solidária e contínua, na vasta sucessão das eras e na imensa amplidão do nosso globo.
É a convergência de vossos esforços - afetivos, intelectuais e práticos, que' a vossa 'sabedoria 'resumiu nesse único vocábulo Humanidade. Concepção portentosa, elaborada a lento e lento pelos entes privilegiados, que foram o resumo de todas as construções anteriores, para desabrochar, depois da mais temerosa de todas as crises, no cérebro imensurável de Augusto Comte."
O dia de hoje é pois, consagrado pelo positivismo, à celebração da mais vasta das Unidade - a Unidade Doutrinária.
Celebrada pela primeira vez, em nossa Pátria, a 1º de Moisés de 93 - 1º de janeiro de 1881, hoje, oitenta e nove anos depois, seguindo a orientação dos inesquecíveis apóstolos Miguel Lemos e Teixeira Mendes, aqui nesse Templo, o primeiro a ser construído para o culto sistemático da Humanidade, nos reunimos para mais uma vez, reverentes, elevarmos os nossos corações nas efusões de um reconhecimento que é a mais profunda de nossas alegrias.
Glorificar a Humanidade, em sua plena realidade, como vivendo na Terra, envolta pelo Espaço, tal o objeto desta festa.
Como toda concepção científica, baseada, como deve, na observação de fenômenos naturais, esta teve também que surgir espontânea mais ou menos vaga.
Durante uma época imemorial, o Amor, a princípio impreciso, indeterminado, contínua, e constantemente assaltado por ciladas, do mais grosseiro egoísmo, conseguiu apenas a formação de grupos rudimentares, temporários, sem uma verdadeira constituição social. Mais tarde, porém, os instintos sexual e materno, disciplinados pelo apego, instituíram a sociedade fundamental, o primeiro ser coletivo - A Família.
Por muitos séculos, por milênios talvez, foi esta a única sociedade perfeitamente definida, até que o desenvolvimento da atividade pela conquista, que exigia o união dos membros de famílias diversas, para uma empresa comum, fez surgir o novo ser coletivo, que as Teocracias esboçaram na instituição das castas, e Roma criou definitivamente - a Pátria.
Essas duas existências compostas, geralmente admitidas e consagradas, se distinguem ainda pelo aspecto dominante de cada uma delas em relação à nossa tríplice faculdade cerebral. A Família é uma união de sentimentos; é o tabernáculo do Amor. A Pátria é uma união de qualidades práticas; nela domina o caráter. Entretanto em ambas se desenvolve a amizade mais geral - a Fraternidade.
Nascida na família, onde tira o seu nome das relações entre os irmãos* estende-se à Pátria, pelas ligações entre os filhos da mesma cidade ou do mesmo País; irmão e concidadão, exprimem graus diversos, mas análogos da fraternidade, que é assim, primeiro doméstica e depois cívica.
As relações fraternas, circunscritas inicialmente ao lar e à cidade, estendem-se ao planeta inteiro; abrangem o Passado, o Futuro e o Presente; congraçam todos os seres, tudo que concorreu, concorre e há de concorrer para aperfeiçoar a Ordem Universal.
Recordemos esse evoluir da Fraternidade até atingir o terceiro grau.
Sem falar das diversas idades da pedra onde a solidariedade já existia, pois algumas substâncias idênticas são encontradas em diversos pontos da Terra, mostrando que já naquelas épocas remotas, as trocas se faziam; podemos dizer, com exatidão, que o primeiro surto histórico da solidariedade internacional remonta com o predomínio da casta guerreira sobre a sacerdotal. Este grande acontecimento sociológico se produziu quando os faraós passaram o Istmo de Suez, e os egípcios atacaram os assírios pela primeira vez. Então os civilizados começaram a se misturar, de uma maneira contínua, a se penetrar, o que, desde então, não cessou de se estender e se multiplicar.
Os representantes da civilização fenícia, transportando em suas colônias, e em suas expedições, material para trocas, estabeleceram, entre os povos antigos, relações econômicas e mesmo filosóficas, que as expedições de Alexandre deram ulterior vigor.
A civilização romana levou mais longe as suas aspirações e sonhou numa só a fusão de todas as nacionalidades. Tal foi o voto supremo da conquista tenazmente prosseguida pelo gênio civilizador de Roma.
* Irmão em francês frére, em italiano fratello dando Fraternidade.
Com os monoteismos católico e islâmico, o sentimento social tomou-se popular, fazendo confraternizar diversos gêneros humanos e pátrias, As cruzadas tornaram esta solidariedade evidente, e fizeram surgir a "República Ocidental" sistematizada pelo papado.
Em seguida, com as grandes navegações alargaram-se os horizontes, e com o gênio de Colombo, o mundo recebe um novo mundo. Então a noção de solidariedade aumenta. Crescem os laços entre as famílias numa mesma cidade, entre as cidades de uma mesma Pátria, e finalmente entre todas as Pátrias, atingindo o desenvolvimento que hoje estamos presenciando desse intercâmbio humano, que já prenuncia o que será o Mundo do futuro orientado pela Religião da Humanidade.
Nossa espécie elevou-se, pois, da noção elementar de família, à de clã; deste a de cidade; depois à de Pátria, em seguida a de Oriente e Ocidente para em nossos dias, a de gênero humano.
Poderemos dizer que a solidariedade deu nascimento a quatro sistemas de associações, sucessivas e cada vez mais extensas e fraternas: o sistema de nações da alta antigüidade; o da civilização greco-romana; o da idade média e a dos tempos modernos. Mas um novo sistema está evidentemente em via de se organizar. Porque graças ao completo conhecimento de nosso planeta, a uma cultura científico - técnica, a maior difusão do espírito positivo, foi se desenvolvendo uma melhor compreensão entre todos os povos, e que ampliando-se, consolida o sentimento de fraternidade nas relações internacionais, prenunciando o estabelecimento da futura civilização científica pacífica industrial, meta descoberta pelo gênio de Augusto Comte, para a organização política de todos os povos da terra.
Entretanto para atingirmos esse ideal, toma-se necessário, como medida preliminar o estabelecimento da Paz Universal, cabendo aos povos ocidentais tal iniciativa.
Nesta data de glorificação da Humanidade, fazemos ardentes votos para que sejam tomadas medidas políticas capazes de garantir a paz entre todos os povos, no Novo Ano que se inicia.
Hoje, a União supera de muito a independência, e as nações se acham, umas em relação às outras, numa estreita ligação de interesses teóricos e práticos.
A solidariedade econômica é a mais evidente de todas, mas tanto a solidariedade intelectual, como a moral, rivalizam com a primeira, e, se fosse comum fazer-se estatísticas das trocas de idéias e de sentimentos, como comumente se fazem das mercadorias, chegaríamos a resultados os mais animadores.
"Conquanto a continuidade, diz Augusto Comte, seja a princípio menos sentida que a solidariedade, por exigir um exame mais profundo; sua noção deve finalmente prevalecer, porque o surto social, pouco tarda a depender mais do tempo do que do espaço'.
A continuidade é um fenômeno natural, do qual nossa própria existência individual nos dá a primeira noção. Apesar das mudanças que a lei das idades, e a lei do desenvolvimento nos faz sofrer, nós continuamos a sermos nós mesmos, enquanto vivermos normalmente.
Quem pode desconhecer que há continuidade entre nós e os nossos antepassados?
Não somente nosso nascimento e nossa constituição biológica, resultam duma infinidade de influências hereditárias, mais ainda, geralmente também nossa educação, hábitos e condição social.
Entretanto, é sobretudo a continuidade coletiva, que constitui a diferenciação radical entre a espécie humana e as demais espécies animais sociáveis.
Os germes do sentimento desta continuidade, deram nascimento ao culto dos mortos, que tanto distingue nossa espécie das outras.
Este sentimento de continuidade, em seguida, aumentou e se firmou pela instituição da vida social; pela imortalidade subjetiva, pelo respeito aos velhos e tradições, por eles transmitidas pela formação das histórias nacionais; pelo respeito aos livros sagrados das religiões; pela evidente subordinação intelectual, moral e prática do presente ao passado.
Esta solidariedade das gerações que se sucedem, a continuidade, foi cedo apreendida pelos filósofos de todos os tempos, os quais trabalharam para sua sistematização final, a qual devemos ao gênio de Augusto Comte, fundando a Filosofia da História.
Este sentimento foi tão expontâneo, que todos os povos, através de seus maiores representantes, assim se expressaram:
"Nós valemos mais, que nossos pais, dizia Homero, e nossos filhos valerão mais do que nós."
"Os pais comeram uvas verdes, diziam os profetas de Israel, e os dentes dos filhos estão ainda embotados*." * (enfraquecidos)
Pode-se mesmo perceber um primeiro esboço da concepção sistemática da continuidade da Humanidade, nos Campos Elíseos dos antigos, lugar afortunado onde reinava eterna primavera, um ar puro e perfumado, e no qual se reuniam as almas dos poetas, dos filósofos, dos heróis e de todos os justos, que assim recebiam a recompensa de seus serviços. As expressões - ".comunidade humana" "cidadão do mundo", são freqüentes na pena de Cícero.
"Nós todos somos os membros de um grande corpo, escrevia Soneca. De Terêncio - Nós somos os herdeiros daqueles que morreram, os associados daqueles que vivem, a providência daqueles que nascerão."
Augusto Comte considera São Paulo como um dos pensadores que sentiu melhor a concepção de Humanidade quando propaga - que "Somos todos membros uns dos outros".
A Constituição da cristandade, participou poderosamente, estendeu e popularizou este sentimento, que a antigüidade viu surgir, e parece que foi sob a pena de um doutor do catolicismo, que se encontra, pela primeira vez formulada de uma maneira explícita, a idéia desta Sociedade de Nações, à qual o nosso século se esforça de dar uma estrutura eficiente.
A espécie humana, diz o teólogo português Soares, que viveu de 1548 a 1617, apesar de dividida em povos e reinos diversos, possui não somente sua unidade específica, mas ainda uma certa unidade moral e quase política, que se descobre nos preceitos naturais de amor e de simpatia recíprocos; que se estendem a todos, mesmo aos estrangeiros. Logo, apesar de todo estado completo, república ou reino, seja em si próprio, uma comunidade perfeita, composta de seus próprios membros, não é menos verdadeiro que cada um desses estados, considerados em suas relações com a espécie humana, faz, de qualquer modo, parte de uma unidade universal.
Porque jamais as comunidades serão auto-suficientes em seu isolamento para poderem passar sem ajuda mútua, de sociedade e de comunhão com as demais, no que diz respeito ao aperfeiçoamento de suas condições de progresso material, e algumas vezes mesmo a satisfação de suas necessidades morais. Tais são os ensinamentos da experiência. Por esta razão, lhes é indispensável Ter uma lei que os dirija e os coloque em seus lugares nesta espécie de comunhão ou sociedade.
E, ainda que a razão natural lhes tenha lugar de lei, em grande parte, há casos onde ela não é nem suficiente, nem bastante imediata; por isso, seria possível que certas leis particulares fossem criadas, cuja prática formaria o ponto de partida. Porque da mesma maneira que o hábito criou leis nos Estados e nas províncias; da mesma maneira é possível que lhes sejam introduzidas entre a espécie humana para a conduta habitual das nações; tanto melhor que estas leis sejam restritas, e que afastar-se-ão menos do direito natural, e que, podendo facilmente serem deduzidas, respondendo às necessidades e às tendências da natureza".
A ligação das gerações precedentes às anteriores, se fez melhor sentir com a difusão do helenismo pela civilização romana; depois, em seguida às cruzadas, quando as ciências, conservadas e cultivadas pelos árabes, foram reintroduzidas na Europa; enfim quando os humanistas ressuscitaram, no Ocidente, o culto das letras e a admiração de todas as obras primas da antigüidade.
Foi somente depois de uma suficiente emancipação teológica que os embriões da grande concepção, pôde realmente desabrochar, graças ao espírito positivo, à atividade prática, e a evolução das ciências e das artes. Coube aos pensadores do décimo sétimo século, a glória de dar a esta concepção uma fórmula filosófica luminosa.
Descartes a esboça quando expõe - "que a nós mais convém o nome de antigos, - porque o mundo é mais velho e temos uma maior experiência, e que juntando as vidas e trabalhos de vários, nos iremos todos juntos, muito mais longe que cada um, em particular, não poderia fazer".
"Entretanto, a primeira expressão científica geral de Humanidade pertence a Pascal. Sua importância histórica nos leva a recordar esse seu interessante apanhado:
" O homem está na ignorância na primeira idade de sua vida; mas se. instrui sem cessar em seu progresso porque tira vantagem não somente de sua própria experiência, mas ainda da de seus predecessores; porque guarda sempre em sua memória os conhecimentos que uma vez adquiriu e que os dos antigos estão sempre presente nos livros que lhes legaram. E como conserva estes conhecimentos pode enfim aumentar facilmente; de sorte que os homens estão hoje no mesmo estado onde se achavam estes antigos filósofos, se eles pudessem envelhecer até o presente, juntando aos conhecimentos que tinham aqueles que .seus estudos teriam podido fazer adquirir a favor de tantos séculos. Daí vem que pôr uma prerrogativa particular, não somente cada homem avança diariamente nas ciências, mas todos os homens em conjunto aí fazem progresso contínuo, à medida que o universo envelhece, porque a mesma coisa acontece na sucessão dos homens que nas idades diferentes de um homem em particular. De sorte que toda a série de homens, durante o curso dos séculos deve ser considerada como um mesmo homem que subsiste sempre e aprende continuamente".
Depois que Pascal nesse magistral apanhado caracterizou a preponderância do passado na vida da Humanidade, Leibnitz, apanhou a subordinação do futuro ao presente quando formulou. - O presente está grávido do futuro. E P. A . Lacaz; complementa, "tendo como pai o passado"
Já no século 18 quase todos os pensadores proclamavam que trabalhavam para a posteridade, não tendo nenhum deles ilusões quanto a vitória imediata de seus ideais.
Em suas belas cartas filosóficas ao escultor - Falconnet, escrevia Diderot - "Que é a voz do presente? Nada. O presente é um ponto, e a voz que ouvimos é sempre a do futuro e a do passado. Estes filósofos, estes ministros e estes homens verdadeiros que foram vítimas de povos ignorantes, de padres atrozes, de tiranos enraivecidos, que consolo lhes restava ao morrer? É que os preconceitos passariam e que a posteridade lançaria a ignomínia sobre seus inimigos. Õ! posteridade santa e sagrada! Sustentáculo dos desgraçados que se oprime; tu que és justa, tu que não se corrompes, que vingas o homem de bem, não me abandones nunca. A posteridade para o filósofo é o outro mundo do homem religioso".
Kant, em seguida tentou combinar os dois elementos da questão, de um lado mostrando que "o problema de uma perfeita continuidade social implica o problema de uma constituição regular das relações internacionais e não pode ser resolvida sem que este seja". De outra parte, dando um primeiro esboço da filosofia da história, sistematizando a noção de continuidade, única que pode fazer de uma classe de seres racionais, que todos morrem, uma espécie imortal, Vamos, contínua Kant, ver se conseguiremos achar o fio que conduz à uma tal história, deixando desde então à natureza o cuidado de produzir um homem que esteja em estado de conceber a sorte de encadeamento dos fatos históricos", As palavras de Kant formam uma espécie de predição do que seria a ação de Augusto Comte.
Turgot, em seguida ensaiou desprender, em seus memoráveis 'Discursos sobre os progressos sucessivos do espírito humano, esta lei do encadeamento dos fatos históricos.
"Todas as idades, escreveu ele, estão ligadas por uma série de causas e efeitos que liga o estado do mundo à todos aqueles que o precederam; os sinais múltiplos da linguagem e da escrita, dando aos homens, os meios de se assegurarem a possessão de suas idéias particulares, um tesouro comum que uma geração transmite a outra, assim como uma herança sempre aumentada das descobertas de cada século; o gênero humano, considerado desde a sua origem, parece aos olhos do filósofo, um todo imenso que ele próprio tem, como cada indivíduo, sua infância e seus progressos."
Enfim, Condorcet, lança as bases definitivas da Fílosofia da História, considerando em seu "Esboço de um quadro histórico dos progressos do espírito humano, onde Turgot havia iniciado o estudo, o conjunto dos homens vivendo sobre a terra, como um povo único.
Mas esta obra não foi senão um esboço incompleto, pois seu autor não percebeu o papel histórico da Idade Média, em virtude dos preconceitos revolucionários da época em que viveu.
Finalmente foi com Augusto Comte, que a concepção científica de Humanidade atingiu o estado definitivo, e que este grande problema, que havia provocado, de maneira tão ativa a meditação de uma série de grandes filósofos, recebeu a solução completa.
Segundo as próprias palavras dele, foi sob o impulso direto das idéias de Pascal, Leibnitz e Candorcet, deste último principalmente, a quem chamava de "Pai Espiritual", que ele concebeu a sociologia e chegou à sistematização do dogma da Humanidade.
"Tais são, escreveu Augusto Comte, em sua Política Positiva, os precursores imediatos da sistematização final que me estava reservada, para condensar num mesmo princípio, os sentimentos, os pensamentos e as ações própria da Humanidade".
"O estímulo inexcedível, escreveu Teixeira Mendes, do amor que soube inspirar Clotilde à Augusto Comte, patenteou a seu espírito, as exuberâncias do coração humano, assegurando-lhe por esta forma, o êxito de seus grandiosos cometimentos, Foi então, que ele elevou-se à concepção doutrinária da Humanidade, como centro coordenador de todos os aspectos de nossa existência."
Como a Família e a Pátria, essa nova construção, do gênio abstrato, sistematizou a expansão altruísta da vida humana sem recorrer a entes sobrenaturais. Esta concepção final de Humanidade, elaborada lentamente, teve como máximos intérpretes - Clotilde de Vaux e Augusto Comte. Foi ela quem patenteou a ele, que a mulher constitui a personificação da nova Deusa.
A concepção religiosa da Humanidade, supõe duas noções fundamentais - a teoria dos entes coletivos e a personificação suprema da Humanidade, no tipo materno, a fim de que o mesmo se tome um verdadeiro centro de nossa unidade moral e social.
Foi na sessão do domingo, 4 de abril de 1847, quando Augusto Comte explicava na Introdução Filosófica, de seu Curso de Astronomia Popular, a Influência feminina do positivismo, que ele proclamou o dogma da Humanidade, no meio de uma profunda emoção de seu auditório: Nada, escreveu Augusto Comte, podia tocar melhor ao meu coração, e ao meu espírito, do que. essa unanimidade espontânea que, durante a sessão final acolheu tão profundamente a minha fórmula decisiva, sobre a concentração total do positivismo na concepção mental e social da Humanidade. - esse único verdadeiro Grã Ser ( Família, Pátria e Humanidade), de quem somos cientemente os membros necessários, se dirigirão sempre as nossas contemplações para conhecê-lo; as nossas afeições, para amá-lo; e as nossas, ações para servi-lo.
A memória, do maior dos servidores da Humanidade Augusto Comte, e a dos seus três anjos - Rosália, Clotilde e Sofia, ocorre naturalmente nesta sua máxima festa, consagrada à glorificação de todos os que a têm servido.
Mestre! Possamos nós que nos proclamamos teus discípulos, animados pelo teu exemplo, sustentados pela tua doutrina, guiados pelas tuas teorias, vencer todos os obstáculos, que a indiferença ou a hostilidade semeia no nosso caminho; possamos nós no meio desta época revolucionária, sem nos deixar degradar por qualquer esperança de recompensa, nem nos desviar por qualquer insucesso dos nossos esforços, num espírito de submissa veneração, levar por diante a grande empresa a que consagraste a tua vida, a empresa a regeneração humana, por rneio e no seio do Culto Sistemático à Humanidade.